A crise econômica e institucional que se instalou no Brasil traz à lume medidas do Estado baseadas no discurso por uma necessidade de reformas e cortes. Atualmente formam a pauta de discussão popular duas propostas: a PEC 55, que limita gastos do Poder Público e a dolorosa reforma da Previdência. Entretanto, esse artigo tratará de outra: a “Lei do Salão Parceiro ”(Lei nº 13.352/16).
Referida lei autoriza salões de beleza a realizarem parcerias com cabeleireiras e manicures, que passariam a ser autônomas, tudo contemplado pela chamada “Lei do Salão Parceiro”, tornando desnecessária a contratação nos moldes da CLT.
À primeira vista, a medida não parece ofensiva, mas se adentrarmos nas nuances dessa relação contratual percebemos que seu nascedouro está na destruição da relação trabalhista, outrora obrigatória, que acarretará a perda de garantias do trabalhador (13º salário, recolhimento do FGTS, etc). Em suma, cria-se uma relação de trabalho disfarçada e precarizada pela flexibilização inibitória de direitos, pois, permanecerão presentes os princípios da continuidade, subordinação, onerosidade e pessoalidade, mas surpreendentemente inexiste vínculo empregatício.
Estamos falando de pessoas inseridas em um contexto já muito pobre – manicures, cabeleireiras, que quando estão em um dia excelente para os negócios mal conseguem aferir uma verba suficiente para se sustentarem, ou ainda gastam boa parte do que ganham para bancar do próprio bolso os valores de esmalte, lixa, algodão e outros materiais. Vale lembrar que antes da edição da lei, muitas dessas violações já eram recorrentes, com a diferença, contudo, de que se tratava de algo ilegal; com a edição da lei, muitas das práticas acabaram sendo legalizadas. Em outras palavras, é a precarização de quem já era precarizado.
Por si só, tal lei patrocinada pelo Planalto cria precedentes perigosos para todos os trabalhadores e trabalhadoras; porém, seus efeitos podem ser maximizados se avaliarmos o quadro geral da Reforma Trabalhista em curso. Mais dois projetos em andamento reforçam o material bélico normativo: a Lei da Terceirização e a flexibilização da CLT para permitir a sobreposição de acordos coletivos ante as leis trabalhistas.
Os dois projetos permitiriam a terceirização de serviços mesmo para a atividade-fim das empresas, bem como, a flexibilização de direitos como 13º salário, férias, licença-maternidade, por meio de acordos coletivos. Some esses projetos à lei do salão parceiro e a precarização do trabalho nesses ambientes será absoluta, pois se por um acaso uma manicure venha a ser contratada por meio de CLT, isso não significará melhora em sua qualidade de trabalho e de vida.
Além de precarizar as trabalhadoras e trabalhadores que atuam nesse ramo, a desconsideração do vínculo empregatício nos salões de beleza cria precedente para que outros ramos de atividade econômica se utilizassem da mesma ferramenta, precarizando um maior número de relações de emprego e ocasionando, por exemplo, redução nas retribuições pecuniárias e eliminação de garantias trabalhistas em outras áreas.
Por isso, urge que o Supremo Tribunal Federal seja provocado para reconhecer a evidente inconstitucionalidade dessa lei, em razão da violação à dignidade da pessoa humana, bem como aos dispositivos concernentes aos direitos trabalhistas.
Mário César da Silva Conserva é graduando do 7º período no curso de Direito pela Universidade Tiradentes.
Fonte: Carta Capital – Justificando